Viajar é realmente uma das maiores benesses da carreira jornalística. Das paragens que conheci graças ao bloquinho e a caneta, sem dúvida, a mais exótica foi o Quênia, em maio deste ano.
Em um país em que conheço pouco, encontrei escassas informações na internet e havia passado recentemente quase que por uma guerra civil, não tinha muita idéia do que iria encontrar. Mas vamos a duas historinhas.
Chegada ao
Aeroporto de Nairóbi. Como conhecia pouco do Quênia, travei contato com um jornalista de Nairóbi, o Elias, que conheci através da Associação Internacional de Imprensa Esportiva.
Prestativo, Elias, que é editor de Esporte no "Daily Nation", principal jornal de Nairóbi, se prontificou até a me buscar no aeroporto.
Na chegada, procurei alguém com cara de Elias, até que achei um rapaz negro e magro, com uma plaquinha escrita: "Adalberta Leister". Fascinado com a viagem, perdoei facilmente o erro na escrita.
"Oi, Elias", cumprimentei.
Meu anfitrião logo desfez o equívoco: "Não sou o Elias. Ele não pôde vir e me mandou." Deduzi logo que se tratava de um motorista do jornal.
Travei farto diálogo com o Cyrus, nome do motorista que me levou até o Hilton Nairóbi, hotel em que ia ficar. Ele confessou ter sido fundista na adolescência(posteriormente descobri que no Quênia quase todo mundo é ex-corredor).
Na chegada ao hotel, fiquei sem jeito de pagar pelo bom serviço prestado. Não fui cobrado. Nem havia taxímetro. Achei por bem fazer duas cortesias. Primeiro peguei o número do celular do Cyrus e prometi a ele que o chamaria caso precisasse de seus serviços. E fiz questão de dar-lhe US$ 5 de gorjeta (ignorava então se era muito ou pouco).
Sem jeito, achei que por modéstia, ele pegou a nota.
À noite saí para jantar com o Elias. Ele me levou a um restaurante típico do Quênia, coisa que queria muito conhecer. Na saída, me deu carona até o hotel.
Já estava quase deixando o carro quando ele perguntou se tinha dado tudo certo com o Cyrus no aeroporto. Disse que sim, mas confessei que não sabia se pagava ou dava gorjeta para o motorista, que havia sido muito simpático.
"Você deu gorjeta para nosso crítico de música", respondeu-me o Elias, para minha profunda vergonha.
Estava em meu segundo dia em Nairóbi e ainda não tinha satisfeito totalmente minha vontade de experimentar pratos típicos do Quênia.
O engraçado é que quanto mais procurava pelas ruelas do centro de Nairóbi, menos encontrava algum local que soasse como típico. Havia restaurante chinês, mexicano, botecos, pizzaria, casas de massas e nada que tivesse um ar mais exótico.
Ao contornar o
City Hall, no final da avenida que me conduzia ao Hilton Nairóbi, finalmente encontrei o que procurava.
O restaurante era bem apertado. Dentro só havia negros, o que já me indicava que era freqüentado preferencialmente pela população local. E não poderia ser mais típico: as pessoas se serviam numa espécie de bandejão, que me pareceu apetitoso, até pelo fato de haver fila.
Uma senhora servia a gororoba. As mesas estavam quase todas ocupadas. Mas o restaurante era tão popular que achei que não pegaria mal sentar no meio de desconhecidos.
Sem pestanejar, peguei minha bandeja e entrei na fila. Foi quando outra mulher, muito solícita, perguntou-me: "O sr. é estrangeiro?"
"Sim, sou brasileiro. Quero conhecer melhor o seu país e a culinária local", respondi, já pronto para responder questões óbvias sobre futebol e Carnaval.
"Então, aqui é um restaurante católico para homeless", contou-me, meio sem jeito, a atendente.
Diante da perspectiva de roubar o sopão de mendigos quenianos só pude virar as costas rapidinho. Se ficasse, com certeza iria direto para o inferno, sem direito a baldeação no purgatório.